São inúmeros os desafios que envolvem as viagens interplanetárias tripuladas, desde a exposição à radiação cósmica às longas jornadas pelo espaço com quantidade limitada de comida e água. Mas num estudo fascinante publicado recentemente, cientistas ucranianos propuseram um método inovador de viagem espacial: pegar carona em asteroides que passam próximos à Terra. Algo tão fantástico que lembra as aventuras do Pequeno Princípe, que laçava cometas para viajar pelo espaço.
Escrita há mais de 80 anos, O Pequeno Príncipe, a obra prima de Antoine de Saint-Exupéry, é, até hoje, um dos livros mais vendidos de todos os tempos, onde o autor conta as experiências de um garoto em suas viagens pelo espaço. Mas foi na série animada dos anos 70, As Aventuras do Pequeno Príncipe, baseada no livro de Saint-Exupéry, que o menino aparece pegando carona em cometas para viajar pelo Universo conhecendo mundos exóticos e planetas distantes.
No livro, as viagens do Pequeno Príncipe nos lembram do fascínio de explorar o desconhecido, e, agora, a ciência tenta tornar real essa fantasia utilizando asteroides como aliados silenciosos para a exploração humana. Lamentavelmente, para o lado poético dessa história, o estudo ucraniano descarta a possibilidade de viajar em cometas, que podem entrar em atividade durante a missão. E também, diferentemente do livro e do que possa parecer, a ideia principal não é usar o asteroide como meio de transporte, e sim, como escudo.
Ocorre que, em qualquer viagem interplanetária, a espaçonave e seus tripulantes estariam expostos a radiação proveniente do Sol e de nossa própria galáxia. Essa radiação é extremamente nociva à saúde dos seres humanos e podem causar danos ao Sistema Nervoso Central dos tripulantes, comprometendo todo o resto da missão. A única forma de protegê-los seria instalando na nave escudos pesados, que demandariam combustível e espaço adicionais, representando um enorme aumento de custo da missão.
Agora se aproveitássemos um asteroide, poderíamos proteger a tripulação dentro dele, sem qualquer tipo de gasto adicional uma vez que o asteroide já estaria à caminho de Marte, por exemplo. Seria uma solução brilhante se não fosse tão complicado instalar a tripulação no interior de uma rocha viajando a dezenas de km/s no espaço.
Alcançando asteroides no espaço
Para se usar um asteroide como escudo, precisaríamos alcançá-lo no espaço, porque infelizmente ele não pára no ponto. Aí, teríamos também que atracar nele e, de alguma forma, perfurá-lo, criando nosso abrigo no interior da rocha espacial. Isso exigiria uma técnica precisa e um conhecimento profundo sobre o asteroide, além de tecnologias capazes de lidar com essas rochas no espaço.
No final do trajeto, precisaríamos deixar o asteroide e manobrar para entrar em órbita ou descer até o planeta de destino. Tudo isso é bem complicado, mas os ucranianos, mesmo reconhecendo os enormes desafios técnicos envolvidos, se limitaram a selecionar asteroides que seriam candidatos a essa carona espacial.
O estudo analisou mais de 35 mil objetos próximos à Terra, procurando por aqueles que terão aproximações sucessivas com dois planetas entre Vênus, Terra e Marte, no período entre 2020 e 2120. No fim, eles encontraram 525 asteroides que poderiam ser usados para transferência entre os planetas.
162 candidatos a uma carona, que eu não faço questão, entre Terra e Vênus, 87 entre Terra e Marte, 79 para o retorno de Marte para a Terra, e 161 para trazer para a Terra o que sobrar daqueles que forem para Vênus. Quem quiser ir de Marte para Vênus terá 17 candidatos à carona e de Vênus para Marte, 19. “As pessoas grandes adoram os números”.
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As viagens feitas de carona em asteroides tendem a ser mais rápidas que seguindo a trajetória convencional, mas não por conta do asteroide e sim por sua órbita, que pode “cortar o caminho” até o planeta de destino. Só que isso tem um custo: gasta-se muito mais combustível para alcançar a mesma velocidade do asteroide e, depois, para ajustar para a velocidade do planeta. Em contrapartida, viagens mais rápidas implicam em uma quantidade menor de suprimentos para a tripulação, o que pode balancear essa equação.
Agora é preciso dizer que utilizar asteroides para viajar pelo espaço, no momento parece uma ideia inviável. A complexidade e os riscos envolvidos são grandes demais para uma missão tripulada. Mas se pararmos para pensar, há 100 anos talvez parecesse um absurdo colocar pessoas na ponta de um foguete e acender o pavio para mandá-los para a Lua. Então, quem sabe, com os avanços tecnológicos em áreas como robótica, inteligência artificial e propulsão espacial, essa aventura cósmica “à la Pequeno Príncipe” poderá se tornar mais real que um devaneio poético.
E, como bem nos ensinou Saint-Exupéry, “o essencial é invisível aos olhos”. O verdadeiro valor dessa jornada não estaria apenas em alcançar novos mundos, mas também em aprender com os desafios, em apreciar a beleza do universo e em descobrir, como o Pequeno Príncipe, que “é preciso suportar duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas”.
Ao explorar o espaço a bordo de asteroides, não estaríamos apenas expandindo as fronteiras do conhecimento humano, mas também nos conectando com a poesia do Cosmos, com a beleza e a fragilidade da vida em um Universo vasto e misterioso.
Talvez, em um futuro não muito distante, possamos olhar para o céu e ver, entre as estrelas sorrindo no céu, uma ou duas que se movem, de mundo em mundo, viajando entre planetas como pequenos príncipes em seus asteroides, explorando o Universo com a mesma curiosidade e a mesma coragem de uma criança que inspirou Saint-Exupéry a escrever sua obra-prima.
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